Tarde meta[física] (ao amigo Ton)
Era uma tarde de quarta-feira(chuto). Um dia de reunião para um grupo de estudantes militantes. Acredita-se em tantas coisas quando na primeira juventude, não é? De hoje o objetivo do encontro parece opaco: ver e debater O ponto de mutação, filme inspirado do livro de um físico crítico da física. Capra, vocês devem conhecer.
Diferente dos contatos iniciais com a ciência, esse encontro começou em debate filosófico diletante. Coisa boa. Pois na escola, saber dos estados da matéria era chato. Ali não, todos queriam dar opinião sobre os fundamentos da ciência em si, um verdadeiro exercício de epistemologia dos mais delinquentes. No fundo, acertava-se tudo. Quem discordava, estava certo no direito de não aceitar passivamente a opinião alheia. Disturbio póstumo foi ter de admitir que tal principio já havia sido tributado, não se sabe se corretamente, a Voltaire, antes mesmo da Revolução Francesa. Não éramos inovadores. Já se havia dito antes” Discordo de você, mas morro para garantir o direito de poder lhe ouvir.” Encontrava-se, porém, uma vantagem no propósito pós-iluminista: sabida as mortes, a guilhotina, a violência do Terror, resignavam-se os jovens do novo mundo ao verbo, à verborragia conciliadora e democrática. Os supostos revolucionários nunca chegaram as vias de fato. A forma detivera o mundo sensível, a palavra reteve o universo, os macros, os micros. A exterioridade do real parecia evidente mesmo se questionável. Uma jovial cordialidade newtoniana à brasileira!
Ninguém via nesse clima problema de cinismo relativista. Afinal de contas, não existia respeito pela idéia falsa, apenas vontade de deixar sair o pensamento. A justeza era importante, mas a possibilidade do expressar tinha sido prioridade garantida pelo principio de Justiça. Naquele clima, questão de honra era encontrar-se mais próximo da verdade deduzida, extraída pela razão especuladora do real do mundo. Todo mundo era inconscientemente racionalista.
O que se entendeu do filme? Quem sabe? É provável que apenas a noção de paradigma tenha sido clara o suficiente para resistir à ignorância do momento. Mas isso não é importante. Seriam essas lembranças puro saudosismo? Mas longe de casa, não seria saudade, mesmo em “ismo”, algo nobre? Ou seriam apenas elementos para tirar do passado não muito distante uma fortuna de motivações iniciais para uma reflexão sobre a importância da curiosidade extra-escolar?
***
Aproveitando o ensejo
(Retificando…)
O querido Bernardo Jurema pediu-me um texto sobre a escola. Não sei nada sobre escolas. Meu texto anterior não pretendia falar propriamente disso. Sempre tive problema com essa coisa. Dado diz que eu procuro “pedagogização”. Sou péssimo nisso. Tudo que é formal me apavora. Minhas notas atuais em estatística são os indicadores.
O que tentei fazer em breves linhas foi refletir sobre as dificuldades e facilidades na escola de pessoas vindas de origens sociais diversas. Por quê? Bem, acho muito interessante a argumentação de Bourdieu nesse sentido, pois ela sai daquela coisa do “o cara tem jeito para escola” e consegue dar resposta sociológica às razões de tanta dificuldade dessas pessoas de classes sociais menos favorecidas. A sociologia dele encontra causas para o “não dar certo na escola“. O dar certo fora da escola não era meu ponto. Menos ainda o papel que escola deveria ter num “dar certo na vida”. Esclarecido esses detalhes, volto ao Graciliano.